Há alguns meses, um amigo ficou chateado porque presenciou discurso de ódio rede social, Facebook. É uma lástima que usemos esse meio para esse fim. Pensando nessa questão, escrevi um pequeno texto em homenagem a preocupação de meu amigo que também compartilho. Um outro amigo publicou na Revista ASSERERJ, maio/junho que ele edita. Escolhi essa imagem porque ela bem representa o que também sinto: um desamparo profundo nestes dias. Assim como esta pequena perdeu a mãe na guerra, também nós estamos a perder a esperança de um convívio digno com o outro.
Eis o texto em homenagem a meu amigo Antonio Rodrigues.
DE QUE NOS ALIMENTAMOS?
Vivemos atualmente um tempo em que o ódio persevera, tanto nas ações, quanto nos discursos. Digo isso não porque estou a parte, ao contrário, sou partícipe também desse destempero coletivo. Digo isso justamente porque sinto minha alma ressequindo-se gradativamente.
Outro dia, num desses estados de silêncios, ouvi o pedido de socorro de minha alma. Na verdade foi um grito silencioso que ressoou profundamente dentro de si e cuja vibração atravessou o próprio corpo que a abrigava. O grito liberta-se e tenta desesperadamente ecoar pelos espaços públicos e quiçá pelo universo.
Contemplei tudo isso e senti pena de minha pobre alma, que precisou fugir de mim para tentar se alimentar de outras iguarias menos nocivas que o ódio para continuar existindo. Senti mais pena ainda, por perceber que ela tentava entrar em contato com outras almas no intento de pedir auxílio, mas o que ela encontrou fora do meu corpo foram almas tão famintas quanto ela. Umas não sabiam por que sentiam fome. Estas vociferavam mais do que as outras que, de algum modo, intuíam o motivo pelo qual estavam morrendo de inanição.
Observei que minha alma ficou desnorteada e esquadrinhava tudo ao redor na tentativa de ser ouvida. Mas, como uma desvairada, percebeu que seu grito atravessava todas as almas que encontrava. Eram almas-vácuo. Dada a natureza dessas almas, seu grito jamais se propagaria nelas. Contudo, ela notou que umas poucas sentiam uma leve sensação de ouvir algo como nos últimos acordes de um som que se dissipou na travessia do espaço-tempo.
Desolada, desértica e fustigada por tempestades violentíssimas de ódio, minha alma cabisbaixa, “rabo entre as pernas”, caminha lentamente para sua antiga morada, meu corpo.
Eu, vendo a desolação dela, chorei convulsivamente em desespero, como uma mãe que vê seu filho morrer pouco a pouco de fome e sede. Abrigo em meus braços minha alma com todo carinho e num último gesto, imploro por um prato de tolerância e uma gota de ternura.
Esse texto foi originalmente publicado na Revista ASSERERJ, eis o link:
http://www.youblisher.com/p/1164619-REVISTA-ASSERERJ/
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