Frida Kahlo foi excepcional como mulher, para além dos padrões da sociedade da época e também como artista tardia.
A estética do filme é super interessante. Tem umas montagens que dá
leveza até mesmo no diagnóstico do acidente da pintora. As cores bem ao
estilo latino, vibrantes, bem como o vestuário e os acessórios. As
músicas são outro elemento excitante e forte. A história da pintora é amenizada no filme e alguns acontecimentos da vida dela foi romanceado.
Não se
intimidem com as tragédias da vida de Frida Kahlo, o filme não é um
drama pesado, embora isso não queira dizer que não tenha sido para ela,
porque foi. Mas o diretor não quis ressaltar essencialmente a desgraça,
mas a genialidade e perseverança dessa artista que contra toda a "sina",
fez de sua existência uma experiência muito impactante tanto para ela e
seus contemporâneos quanto para mim, que aqui me encontro em pleno feriadão a espreita do outro lado de seu
tempo.
A montagem da conquista de New York por Rivera é cômica. E a gringolândia, melhor ainda huahuahua. Muito bão.
Abaixo cito alguns diálogos e frases do filme que me comoveram.
Sobre Diego Rivera
"Tudo se encaixa na mão dele", "é a maneira como ele olha pra você", "ele acha beleza na imperfeição", "Diego não pertence a ninguém, pertence a si mesmo ..." (com toda certeza foram essas qualidades que fez com que Frida se apaixonasse por ele perdidamente até o dia de sua morte e quem sabe até depois?)
Sempre que penso em pintores, concluo que eles transformam suas impressões em expressões mediadas pelos cinco sentidos e depois as imprimem em suas telas e estas chegam até nós, estranhamente estáticas, mas profundamente tagarelas. Nos dizem tanto. Algumas vezes nos expôem a alma do pintor e, em outras, nos faz expor as nossas. É mais ou menos o que sinto com alguns textos em que o autor escreve o que sente. Gosto de sentir o gosto da alma de quem escreve no que leio, talvez seja por isso que também escrevo o que sinto, por mais que isso me exponha. Quem sabe eu não tenha medo de esquecer o que sinto (como Manuel Bandeira que em uma poesia reclama que confiou em sua memória e ela o traiu) ou o que penso que sou. Seja lá o que for, são apenas vestígios de mim ante o Universo.
O diálogo do intelectual /filósofo marxista Leon Trótski com Frida sobre a dor é espetacular! De tirar o chapéu a sensibilidade do roteirista. Reproduzo as falas na dublagem do filme para o português:
- Frida, como é conviver com a dor?
- Nem dá para explicar direito. Já me cortaram e me remontaram tantas e tantas vezes. Eu pareço um quebra-cabeças. Na verdade todas as operações fizeram mais estragos que o acidente. Tudo dói, mas a perna ... a perna é o pior. Mas eu estou bem. No fim das contas o nosso corpo mostra que suportamos mais do que podemos.
- É isso o que eu adoro nos seus quadros. Eles trazem essa mensagem. Você disse que ninguém os entende, mas acho que está enganada, porque seus quadros expressam o que cada um sente quando está sozinho e sofrendo
- Talvez. Leon, me fale sobre os seus filhos.
- Meus filhos... as meninas foram assassinadas, assim como um dos meninos. Nos pensávamos que o outro estava vivo na prisão. Mas aí recebemos uma carta... ele tinha sido executado também. No fim, todos morreram. Eu condenei minha família e também estou condenado.
- Não deve dizer isso.
- Mas é verdade. Stalin tem mais poder do que qualquer czar. Estou sozinho com alguns amigos e nenhum recurso contra a maior máquina assassina do mundo. A única coisa que me resta é continuar trabalhando e vivendo. Você não pode nem imaginar que alegria é para mim estar aqui vendo tudo isso. É a primeira vez em anos que me sinto gente de verdade.
Outro ponto alto do filme é o depoimento de Diego Rivera sobre a obra de Frida, na exposição que montaram em homenagem a ela em seu país, é comovente.
- Vi uma garota magra com olhos arregalados, gritando para mim "- Diego eu quero te mostrar meus quadros". Mas é claro que ela me fez descer até ela. Então eu vi e nunca mais parei de olhar. Mas eu quero falar sobre Frida não como marido, mas como artista. Um admirador. O trabalho dela é ácido e meigo. Duro como o aço e suave como uma borboleta. Admirável como um sorriso e cruel como a amargura da vida. Eu não acredito que antes tenha existido uma mulher que colocasse tanta agonia poética numa tela.
Esta é a última anotação em seu diário. É uma sentença majestosa: "Espero que a partida seja festiva, e espero nunca mais retornar". E quem poderia condená-la? Depois de passar por tudo o que passou?
Enfim, recomendo a película.
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